terça-feira, 10 de junho de 2008

Houve um Dia...

Houve um dia que por um motivo qualquer eu achei melhor ouvir. Já que meus olhos não viam mais, resolvi escutar os sons que me tirariam do inferno. Foi então que guardei o MP3 na mala pesada e comecei a reparar na rua. Eram gatos, cachorros e grilos, a TV ligando na novela das oito, o cara chigando o outro e buzinas por todos os lados. Era o caos mas também era a paz com seus silêncios momentâneos e bichos escondidos nas árvores.

Olhei para o céu e só pude ver a escuridão imensa e opaca que minha cegueira permitiu. Senti medo. Tive horror e me senti sozinha como algumas poucas vezes. Lembrei de um tempo maldito, tive visões. Houve uma mistura de angústia e dor. O vazio dominou meu corpo e já não haviam sons, era só a tristeza. Era simples: estava sozinha... Abandonada a própria sorte nesse mundo de ninguém. Nada poderia mudar isso. Nada... Nada...

Com lágrimas de algum sentimento ruim que eu não saberia explicar, coloquei as mãos sobre os olhos e chorei. Chorei um choro acumulado de meses, um choro quase infantil. Um coro de soluços e lamentos que durou tão pouco quanto merecia. Ainda sem abrir os olhos eu senti... Acima de tudo, eu senti! Era o sabor das lágrimas matando a sede de anos, era o cheiro de um suspiro de vida entrando novamente, era a sensação do vento penteando meus cabelos e abraçando minha alma. Era, finalmente, o som do mundo gritando que havia um lugar para mim.

Resolvi abrir os olhos e a imensidão não me deu mais medo. Na verdade ela me trouxe felicidade, me trouxe a alegria de entender definitivamente que eu nunca estive sozinha. Havia sempre outra pessoa que andava junto comigo e mesmo sem vê-la eu pude saber que ela existia. Pude me ver feliz, essa felicidade que a gente decide sentir sem ter porque e se torna parte da gente.

Depois disso comecei a escutar mais. Ver as pessoas já não era mais suficiente, as imagens podem ser falsas. As palavras não precisam ser verdadeiras, mas pelo menos foram ditas e se tornam um fato. Já olhares não provam nada do que as palavras desmentem... Comecei então a não ter medo, comecei a gostar da minha própria companhia. Aprendi a me amar e tirar o pior de mim. Aprendi a ser feliz.

Tudo isso porque houve um dia... Independente de tudo houve um dia... E ainda haverão muitos outros...

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