sábado, 27 de abril de 2013

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And then everything was confused. If you don't wanna be fogotten, act like someone who should be special.


(Listening: Beirut - Goshen)

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Out

Ele acordou com tudo fora do lugar.
As prateleiras carregavam livros desinteressantes. Os armários estavam cheios de roupas que não eram suas. Escreveu um recado com uma letra que não era sua. Divagou sobre um momento que certamente não era o seu.
Claro que era um sonho. Daqueles que lhe levam pra um universo aterrorizadamente palpável mas irreal.
Decidiu parar de invadir os lençóis desconhecidos. Procurou por um banheiro, uma água que pudesse provar que não estava em lugar algum. A sensação do toque da sola dos pés era conhecida. A orientação natural o levou exatamente para onde queria chegar. Umideceu as mãos e molhou todo o chão do banheiro, na tentativa de afastar as olheiras, de uma maneira tão íntima que não soube explicar. Os passos o levaram para a vista rotineira da varanda.
Assustou-se com a perfeição que sua imaginação criara esse mundo paralelamente tão próximo ao seu. Como numa sequência pré-definida, pegou a manteiga, que estava no lugar correto da geladeira, aqueceu as fatias de pão de forma e sistematicamente fez a mistura adequada. Usou a caneca do chá. Cortou o mamão e tirou as sementes.
Alimentou-se e deu conta que estava sozinho na casa-do-sonho. Lembrou de algo que deveria fazer, mas que estava num lugar tão distante da memória que não saberia dizer se era importante ou não. A campainha tocou e beijinhos apressados lhe diziam isso-aquilo-e-aquele-outro. Não era uma sensação de primeira vez... E os beijinhos separam uma roupa que não era sua e instruiu a vesti-las.
Como uma reação máquina, seguiu as instruções pois já estava interessado em saber em que ponto daquela maluquice ele acordaria cansado e descobrindo que ainda eram três da manhã.
Os beijinhos eram roteiros e determinação, sabiam o que deveria ser feito. Levaram-no, bem vestido, a um lugar cheio de vidros e de plantas que você vê nas agências bancárias. Colocaram-no numa cadeira bacana e mais confortável do que qualquer uma que já havia testado. A sala era legal, muita iluminação e pouca janela, mas era legal. Reparou que seu nome estava em algum lugar dali, mas não prestou atenção em onde nem o porquê.
Beijinhos sairam excessivamente animados e entraram abraços e olhares duros. Abraços só agiam de maneira irregular e confusa, já olhares duros diziam coisas a serem feitas e prazos e metas e pessoas e conexões e mais uma porção de e's que não saberia repetir.
Começou a se entediar com o sonho. Já havia ido longe demais e o despertador não o chamava.
Uma hora beijinhos apareceram bravos por qualquer motivo que não sabia e se deu conta que aquela noite de sono estava contando uma história de dias e dias. Continuou nos lugares desconhecidos e voltando para a casa toda fora do lugar. Precisava saber onde aquilo ia parar, já estava envolvido com os personagens e consigo mesmo naquele papel.
Volta e meia alguma coisa naquele ritmo sem sintonia mudava e ele não se entediava tanto. Nesses momentos até achava que aquele sonho valeria a pena no final. Já pensava em como ia contar para os amigos aquela experiência tão bizarra de experimentar uma vida que não era a sua. Nos inúmeros momentos de desinteresse, ele arquitetava o que faria quando acordasse, o café que tomaria e a roupa pra sair.
Finalmente um momento de emoção! Aquele sonho o fez sentir! Era uma dor não muito agradável na verdade. Uma coisa física mesmo, ali no meio do peito. Havia brigado na rua? Beijinhos corriam e gritavam, abraços estavam sérios e não via olhares duros. Por um instante saiu de si e conseguiu se ver. Estava diferente e mudado. Sabia que era o próprio mas não o reconheceria quando acordasse. Apesar a atmosfera tensa, estava gostando de sentir algo depois de todo o tempo de tédio.
Deu adeus a si mesmo.
E não acordou.
Seu enterro aconteceu no mesmo dia a noite. Cemitério da Saudade. Causa mortis: inadequação ao meio.



(Listening: Radiohead - Fake Plastic Trees)

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Bem

E mais uma vez nos colocamos de frente para esta casa, que não tem teto, não tem nada. Essa relação forçada que nos encontramos, vazia, inexistente de razão e qualquer tipo de relacionamento.
-Se não faz sentido então cala a boca.
Seria mais fácil dizer.  Seria mais fácil extrapolar o ritmo e a dinâmica a qual nos forçamos viver. Talvez fosse menos lógico, menos ortodoxo, tradicional. Mas talvez seria mais autêntico e mais viril.
Mas talvez também não fosse nada. Só mais um monte de pó para os tantos que colecionamos. Mais um ponto vazio, mais um negativo para se acrescentar.
-Mas toda experiência não é válida?
E toda a insanidade é loucura? Não meu bem, talvez não devêssemos divagar tanto e tanto. Usar as mesmas palavras para as velhas mentiras. Não! Tenta criar um algo novo pra acreditar. Para de usar as mesmas expressões que estão te cansando.
-Talvez eu devesse ler outros livros, sentir outros ares, outras inspirações...
Que lhe fariam voltar para a mesma redundância que estamos agora. O consumo do invisível. A digestão das ideias já passadas.
-Você fez aquela promessa? Pintou aquele retrato?
Seus planos, sua invenção, seu retrato, era uma figura?, não importa... Você não fez. Você não acreditou que o amanhã não existe e o amanhã nunca chegou. E agora, perto do fim, o que se espera é a realização dos momentos não vividos e das horas não compartilhadas.
-Para de ridicularizar.
O ridículo quem sabe seja nosso momento de revelação, um pico de verdade. Uma hora que a gente se distrai e mostra o que queria esconder. Como aquele breve momento em que a pouca conexão não existiu. Você já falou sobre silêncio e eu não consegui calar.
Paradoxos. Não é questão de incoerência, só estou repleta de paradoxos.
 
 

quinta-feira, 11 de abril de 2013

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Criando...
Tô criando uma coisa nova. Tô inventando um mundo novo cheio de ideias antigas (dessas que até já vem sem acento). Refinando pensamentos, comprando novos livros e sugestões. Dando espaço pra músicas inesperadamente belas e detalhes surpreendentemente imperceptíveis. E dentro de todos os gerúndios, reescrevendo um jeito velho de viver.



(Listening: Lenine - Marco Marciano)

domingo, 7 de abril de 2013

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Talvez a gente se apaixone pra justificar o tempo que a gente perde não tomando decisões e não fazendo o que se deve ser feito. Não que se apaixonar por si só não seja possível, tolice! Mas às vezes é mais fácil terceirizar a culpa do que assumir que se foge do futuro.



(Listening: Marisa Monte - Segue o Seco)

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Milan

Hoje foi o primeiro dia no qual eu vi o sol nos últimas três semanas. Repousei minhas mãos sobre a janela para sentir um pouco daquele calor tão conhecido e assisti ao desenvolver de um céu azul que quase pareceu irreal.
Infelizmente a sensação não durou tanto tempo. O cansaço fechou meus olhos e desperdicei as duas horas seguintes em um desconfortável e profundo sono dos merecidos. Acordei com o comissário pedindo que desligasse minha música e me preparasse para o pouso.
Foi bom. Pude me despedir do calor inalcançável.
Lá embaixo um domingo problemático e cinza me aguardava para não me deixar descansar. Frio. Pessoas andando com pressa dentro de seus pesados e felpudos casacos. Um tempo desperdiçado.
Pausa para o almoço fora de hora. Relógio marcando tempo errado. Ansiosa sopa de cogumelos. Já esteve melhor... Alteração no pedido. Mastigação. Sem novas notícias, sem surpresas agradáveis. Conta. Obrigada no melhor "thank you" possível. Enfrenta-se o frio para atingir o conforto. Quarto vazio e silêncio. Bom assim. Luz azul e desagrado. Horas jogadas no lixo, mais sentimentos machucados.
Despropósitos, descompassos. Dura e simplória perda de tempo sem razão. Palavras meio ditas e parada. Preciso de banho. Água escaldante para abrir os poros e limpar a alma. De que?! Ligação de amigos. Alguém se importa! Mas não foram atendidas... Confusão e o encontro de um sorriso. Paz. Bem estar e algo próximo a felicidade.
Volta-se o ar.